sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Afinal: o dólar está caro no Brasil?


Redigi este artigo na segunda quinzena de agosto/2015 e, portanto, minhas análises, tese e comentários são baseados na cotação do US$ em 31/07/2015. Outrossim, o artigo não tem a pretensão de discutir os efeitos do US$ mais valorizado, nem as oscilações havidas, causas ou políticas governamentais que interferiram(em) na sua cotação. Boa leitura e reflexão!
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Nos últimos meses temos sido constantemente bombardeados com notícias sobre a desvalorização  do real diante do dólar e, em geral, os meios de comunicação destacam que a moeda norte americana atingiu sua maior marca nos últimos “X” anos. Apenas como exemplo, na noite de 25/08/2015, o Jornal Nacional noticiou: “Dólar fecha pela primeira vez, em 12 anos, acima de R$ 3,60!”
Ao mesmo tempo em que lemos e ouvimos notícias desse tipo quase que diariamente, volta e meia algum economista e/ou especialista é consultado a respeito e os posicionamentos, invariavelmente, deixam as pessoas ainda mais confusas porque explicam o assunto tecnicamente e com o uso de muitos termos que são desconhecidos pela maior parte da população e – muitas vezes – até mesmo por pessoas com elevado grau de instrução.
A realidade é que não se trata de um assunto de simples compreensão, mas infelizmente, as formas como a maioria dos meios de comunicação têm tratado do tema nas várias mídias vem contribuindo ainda mais na geração de preocupações, ansiedades e incertezas das pessoas sobre como isso afeta o presente e futuro do Brasil.
Como não sou economista nem especialista no assunto, venho buscando encontrar uma forma de me comunicar com as pessoas, ajudando-as a compreender (pelo menos um pouco) que a relação entre a nossa moeda e o dólar sempre variará porque existem inúmeros fatores que interferem, mas ao mesmo tempo,  que essa variação não deve representar nenhum fantasma capaz de assombrar ou levar medo para a sociedade, desde que tenhamos nossa economia tratada com responsabilidade por nossos governantes, mesmo que em muitos momentos, venhamos a conviver com instabilidades temporárias, geradas por fatores internos e/ou externos.

Considerações preliminares
Antes de abordar mais objetivamente o tema deste artigo, permita-me tecer comentários sucintos sobre alguns dos impactos  que a taxa cambial provoca em nossa economia:
1.       Como a cotação do dólar interfere diretamente nas exportações e importações, as operações de milhares de empresas são afetadas, positiva ou negativamente e, em muitas ocasiões, gerando expansão ou retração dos negócios de inúmeras delas.

2.       Temos uma inflação mais acelerada que nos Estados Unidos, e assim, a nossa moeda (R$) tende a se desvalorizar em relação ao US$. 

3.       Existe uma tendência  de desvalorizar a moeda como forma de política monetária, a fim de incentivar as exportações, diminuir as importações e gerar um saldo positivo na balança comercial e consequentemente, no aumento das reservas em moeda estrangeira . 

4.       A taxa cambial é utilizada por instituições financeiras como forma de algum tipo de investimento (ex: fundos de investimentos cambiais, os quais têm por objetivo concentrar o investimento de seus recursos em títulos relacionados à variação de preços de uma moeda estrangeira ou de uma taxa de juros denominada cupom cambial).

5.       Quando os investidores internacionais têm uma boa percepção sobre a estabilidade da economia, sentem-se estimulados a investirem no país em novas empresas, aquisições, expansões, o que significa a entrada de recursos que irão gerar mais empregos e contribuir para o fortalecimento da economia. 

6.       O investimento estrangeiro nas Bolsas envolve inúmeras outras questões e, muitas vezes, são de caráter especulativo e, portanto, de curtíssimo prazo. 

7.       Em épocas em que as principais agências de risco internacionais avaliam negativamente nosso país e não havendo nenhuma intervenção por parte do Banco Central, nossa moeda pode se desvalorizar muito mais rápida e acentuadamente. Como exemplo, lembramos que neste século, a maior cotação do dólar ocorreu no dia 16/10/2002, quando atingiu R$ 3,91 (valor este completamente desproporcional à realidade de nossa economia), em parte porque o risco de investir no país cresceu na medida em que as reservas cambiais estavam muito baixas e havia muita desconfiança em relação ao Presidente Lula. De outro lado, inversamente e por conta de decisões equivocadas na gestão de nossa economia, em Julho de 2011, o dólar foi cotado no seu nível baixo, ou seja: R$ 1,54. 
Feitas essas breves considerações, vamos nos focar no tema proposto!
Afinal: o dólar está caro no Brasil?

Tentarei responder essa questão, não como um especialista, mas como uma pessoa interessada no assunto e de uma forma que seja compreensível para a grande maioria das pessoas, bem como baseado em aspectos que considero relevantes para se chegar à uma conclusão com alguma consistência.
Sendo assim, considerei como base de minhas análises:

·         o período de 14 anos e 7 sete meses: 01/01/2001 a 31/07/2015;

·         o poder aquisitivo do R$ e do US$ nesses dois momentos (considerando a inflação acumulada do período); e

·         a inflação acumulada brasileira e norte americana, apuradas pelos índices IPCA (Brasil) e CPI (Estados Unidos – índice oficial da inflação norte americana).

Importante: É lógico que quando analisamos o poder de compra e o atualizamos com base na inflação, precisamos estar conscientes de que ele não reflete a elevação dos preços de forma uniforme, até porque cada pessoa ou família tem o seu próprio índice e quando expandimos para um país, seria impossível mantê-la linear. De qualquer forma, no Brasil, após mais de 20 anos do plano real, a indexação da economia ainda está presente em boa parte (incluindo os salários) e continua dificultando o controle de preços (que deveria basear-se principalmente na oferta e demanda).    
Definidas tais bases, podemos inferir que:
a)      O dólar abriu o ano iniciado em 01/01/2001 cotado a R$ 1,95.

b)      14 anos e 7 meses depois, em 31/07/2015, o dólar fechou o dia cotado a R$ 3,425, sinalizando que nossa moeda desvalorizou-se 75,64% no período. 

c)       A inflação brasileira acumulada nesses 14 anos e 7 meses foi de 157,62%, sinalizando que um salário de R$ 1.000 em 01/01/2001 equivaliam – em termos de poder de compra - a R$ 361,49 em 31/07/2015. 

d)      No mesmo período, a inflação norte americana acumulou 35,18%, sinalizando, portanto, que um salário de US$ 1.000 em 01/01/2001 equivaliam – em termos de poder de compra nos Estados Unidos -  a US$ 733,77 em 31/07/2015.

e)      De outro lado, os R$ 1.000 iniciais, atualizados pela inflação brasileira acumulada até 31/07/2015 representam R$ 2.576,16, enquanto os US$ 1.000 iniciais, atualizados pela inflação norte americana significam agora US$ 1.351,78. 

f)       Em 01/01/2001, os R$ 1.000 possibilitavam “comprar” US$ 512,82 enquanto que, em 31/07/2015, os históricos R$ 1.000 “comprariam” apenas US$ 291,97.

g)      Assumindo que o salário de R$ 1.000 inicial foi atualizado pela inflação brasileira e representa R$ 2.576,16  (em 31/07/2015), esse novo montante (convertido pela cotação atual de R$ 3,425) equivale a US$ 752,16. 

h)      Já o salário inicial de US$ 1.000, que valia R$ 1.950 em 01/2001 e, atualizado pela inflação norte americana acumulada, representa agora US$ 1.351,78, uma vez convertido pela cotação de R$ 3,425, equivale a R$ 4.629,85.


CONCLUSÕES:
Diante de todas essas constatações e, ressalvando a questão da inflação conforme destacado anteriormente, podemos concluir que:

1.       Em Janeiro/2001, com R$ 1.000 podíamos “comprar” US$ 512,82 e, para comprar os mesmos dólares em Julho/2015, precisamos de R$ 1.756,40; 

2.       Em Julho/2015, precisamos de R$ 2.576,16 para manter o mesmo poder de compra no mercado brasileiro, equivalentes aos R$ 1.000 de Janeiro/2001;

3.       Em Julho/2015, com os R$ 2.576,16, podemos “comprar” US$ 752,16, significando que atualmente dispomos de um poder de compra maior em US$ 239,34;

4.       De imediato, parece que a inflação ajudou-nos a poder “comprar” mais dólares, mas...

5.       Em Janeiro/2001, com US$ 1.000 podíamos convertê-los em R$ 1.950 e, para dispor dos mesmos US$ 1.000, em Julho/2015, agora é preciso R$ 3.425; 

6.       Em razão da inflação norte americana, o poder de compra de US$ 1.000 em Janeiro/2001 dentro dos Estados Unidos, equivale a US$ 733,77 em Julho/2015, significa que o dólar desvalorizou-se localmente em US$ 266,23;   

7.       Diante do exposto, parece-nos coerente afirmarmos que a maior quantidade de dólares (US$ 239,94, conforme item 3) que conseguimos “comprar”  em Julho/2015, refere-se a maior parte da desvalorização da moeda norte americana (item 6), permitindo assim, manter uma relativa paridade em termos de poder de compra da nossa moeda (devidamente convertida para US$) dentro dos Estados Unidos; 

8.       Finalmente, concluindo e respondendo a questão do título deste artigo, entendo que a cotação do dólar de R$ 3,425 em 31/07/2015, está dentro de um limite aceitável e consistente com a manutenção do poder de compra do Real em relação ao Dólar, e poderia, inclusive, chegar até a R$ 3,51.


Lembro, mais uma vez, que não se trata de um tema de simples compreensão, mas espero que esta abordagem tenha trazido mais um pouco de luz no assunto e possa ajudar os “não especialistas” a avaliar melhor e saber quando o dólar está caro ou barato.

Bom trabalho!

Autor: Carlos A. Zaffani - Consultor em Gestão de Empresas

 

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